Não "terceirize" a educação dos seus filhos
 
17Apr

Não "terceirize" a educação dos seus filhos

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Claudio Herique

 

 

Minha filha Luiza está às vésperas de completar sete anos de idade. Ela é uma benção na minha vida e da minha esposa. Não poderia ser uma criança mais carinhosa e alegre. Sua inteligência é notável e ela faz conexões de ideias surpreendentes para uma criança da sua idade. Seu entusiasmo contagia imediatamente a todos aqueles que com ela convivem. Ama a escola e os amiguinhos e tem um coração enorme. Recentemente, ela foi diagnosticada com dislexia, que é um distúrbio de aprendizagem, e com TDAH (Transtorno de Atenção e Hiperatividade).
 
Até aí, nada demais. Ela tem um desenvolvimento e inteligência compatíveis com as crianças da sua idade, mas aprende as coisas de uma maneira diferente. Precisa de uma atenção mais individualizada e de muita repetição.
 
Essa descoberta me levou a uma reflexão importante: se eu não tivesse tomado a decisão de parar de trabalhar para poder acompanhá-la mais de perto, nós jamais perceberíamos que havia algo de errado e não poderíamos ajudá-la na hora certa, como estamos fazendo agora. Como resultado, ela fatalmente ficaria desmotivada na escola, pois estaria cada vez mais atrasada em relação aos seus coleguinhas. E o que deveria ser algo agradável, poderia tornar-se um fardo enorme.
 
Hoje eu reflito sobre a situação que eu tínhamos em casa há pouco mais de três anos. Minha esposa e eu trabalhando como loucos, ambos viajando demais. Embora fizéssemos o máximo para ficar ao lado dela nas pouquíssimas horas que restavam, a verdade é que invariavelmente ela ficava aos cuidados de uma babá, sob a supervisão de uma das avós – que sorte a nossa de poder contar com elas nessa hora.
 
Sem dúvida, achávamos que estávamos fazendo o melhor, lutando para construir um futuro mais confortável para a Luiza. Na verdade, isso é o que todos nós fazemos hoje na sociedade moderna. Pagar as contas de casa está cada vez mais difícil, portanto pais e mães não têm muita opção que não seja a de delegar a terceiros o cuidado com os filhos. Mas isso não significa que também devemos “terceirizar” a educação deles.
 
A eventual ausência dos pais não tem impacto apenas na educação formal das crianças na escola, mas também pode ter consequências graves na formação da criança até mesmo como cidadãs, sem contar os perigos aos quais elas ficam expostas.
 
Recentemente, li uma matéria publicada pelo portal de notícias UOL que tem como título “Babás fazem relatos assustadores de pais que terceirizam os filhos”. A matéria é muito interessante e recomendo demais sua leitura. Além de abordar as situações vividas pelas babás e mostrar como alguns pais acabam literalmente entregando a vida de seus filhos nas mãos de pessoas que muitas vezes eles mal conhecem, traz algumas reflexões sobre o que podemos fazer para participarmos mais na vida de nossos filhos e os impactos positivos disso. Pare ler, clique em http://mulher.uol.com.br/gravidez-e-filhos/noticias/redacao/2014/04/08/babas-fazem-assustadores-relatos-de-pais-que-terceirizam-os-filhos.htm
 
Impossível não lembrar de alguns casos que presenciei no condomínio que eu morava em São Paulo. Num deles, havia um menino de uns 8-9 anos de idade, que aprontava o diabo. Colava pedaços de pizza no espelho do elevador, escrevia palavrões nas paredes do prédio, vivia tentando dar rasteira em quem saía do elevador para derrubar a pessoa. Era a figura mais presente no saguão do condomínio. Os pais, nunca vi. Até o dia que o dito cujo tentou me derrubar na saída do elevador e fui comunicar a eles o ocorrido. O pai falou cobras e lagartos dizendo que eu estava exagerando e bateu a porta na minha cara. Falta de educação vem de berço, fazer o quê?
 
Mais tarde, num outro condomínio onde morei, a situação era ainda mais preocupante. Quatro prédios, uma área comum e um terreno enormes. Não era difícil de “perder” uma criança por ali. O que mais me chamava a atenção é que as babás ficavam com as crianças o tempo todo, mesmo nos finais de semana. As crianças um pouco maiores viviam andando sem a menor supervisão pelo prédio o dia inteiro, sempre passando das 10 da noite. E os adolescentes se “amassando” por todos os cantos, pouco se importando com quem passava. Mas o que se via pouco mesmo era a presença dos pais.
 
Em qualquer situação, toda a atenção com as crianças ainda é pouco. Num ambiente como esse, é inevitável que as coisas aconteçam. Certo dia, chego em casa e me deparo com três viaturas do corpo de bombeiros. Eles estavam tentando retirar um menino de 10 anos de idade, que, sabe Deus como, conseguiu subir na caixa d’água de dos prédio, que tinha 29 andares. Outra ocasião, um pai perdeu a cabeça e ameaçou uma criança com uma faca, por conta de alguma coisa que haviam aprontado com o filho dele. Não tive a menor curiosidade de saber do que se tratava, mas coisa boa não foi.  
 
É uma tristeza constatar que alguns pais enxergam a escola como a principal responsável pela educação dos filhos. Sem contar aqueles que, como mostra a matéria do UOL, “terceirizam” essa função para outras pessoas. É importante estar próximos deles o máximo de tempo possível, acompanhar o progresso na escola, observar como se comportam na companhia de outras crianças e, principalmente, ensinar valores que eles só poderão aprender em casa, observando e imitando o comportamento dos próprios pais, que são (ou pelo menos deveriam ser) a maior referência dos filhos.
 
Não tenho dúvida que tomei a melhor decisão quando passei a me dedicar em tempo integral à criação da Luiza e que sou um privilegiado por isso. Claro que a parte financeira pesa demais e às vezes me sinto culpado em deixar nas mãos da minha esposa a tarefa de ser a provedora da casa, principalmente agora, quando as despesas com escola e terapias complementares irão pesar mais ainda no orçamento.
 
Mas sem perdas não há ganhos. Estou certo que esses anos “investidos” na Luiza não preço. Para mim, cada dia que passo ao lado dela tem um valor inestimável. E o resultado prático dessa dedicação, ela colherá no futuro. Embora hoje eu já receba isso de volta com juros e correção, na forma de abraços, beijos e sorriso que ela distribui incansavelmente.  


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